19 agosto 2013

Estágio Leonardo da Vinci em Paris (França)


Há algum tempo que ansiava por um desafio desta natureza, o programa de estágios Leonardo da Vinci foi uma janela para essa oportunidade. Uma experiência como esta, fora da nossa zona de conforto, permite confrontar a nossa realidade e crescer enquanto individuo num novo ambiente cultural e profissional. 

Neste momento, não existem muitas entidades com acordos pré-estabelecidos, na área de arquitetura. E as poucas que existem dão preferência aos seus alunos ou acordos existentes. Mas há que não desistir, e após conseguir algumas cartas de intenção por parte de possíveis entidades de acolhimento, iniciei a minha busca por uma entidade de envio disposta a aceitar a minha proposta. Com persistência e devo dizer bastante sorte encontrei a Associação Spin, com pessoas extraordinárias, apaixonadas pelo trabalho que desenvolvem.

Haaa Paris
Foi assim que a Abril de 2013, iniciei um estágio de 3 meses, numa agência de arquitetura em Paris! 

Viver a cidade de Paris é uma experiência única. É sempre algo surpreendente passear pelas suas ruas livremente e deixa-se invadir pelas suas vistas, luzes, arte e musica. Por detrás de cada boulevard, avenida e praça parece esconder-se um universo cheio de história, imagens, sonhos e mitos. Apelidada por muitos como a cidade do amor e reconhecida como centro cultural e intelectual da Europa, Paris é sem dúvida uma fonte de cultura em constante produção e movimento. Uma coisa é certa haverá sempre algo para ver, conhecer e viver nesta cidade.

              


Neste pequeno trecho do filme Midnight in Paris de Woody Allen, conseguimos reconhecer a beleza incrível desta cidade, mas viver em Paris pode ser uma realidade completamente diferente dos filmes em que é retratada. Sem dúvida uma experiência fantástica, mas devo confessar que não me veria a viver aqui toda a vida.

Para quem está habituado ao ameno clima de Portugal, em Paris é difícil habituar-nos aos invernos chuvosos, onde é possível ter manhas de sol envergonhado e tardes com chuva de granizo! Mesmo no verão parece que os dias de sol são difíceis de encontrar. Outra contrariedade para quem se procura integrar nesta cidade é a dificuldade de criar laços com os parisienses, não são o povo mais acolhedor, sendo pessoas se prezam pela sua individualidade e independência. Quando nos privamos da nossa realidade, pomo-nos à prova perante a descoberta do “ novo” e às dificuldades inerentes a esta experiência. Contudo é este confronto que nos transforma e enriquece o nosso crescimento.

Vou tentar partilhar da melhor forma o que retirei desta experiência e algumas dicas práticas para quem procura viver e conhecer Paris.

Île-de-France
A Île-de-France é uma região administrativa de França constituída pela unidade urbana de Paris e a aglomeração urbana periférica. Existe uma fronteira artificial entre estas duas áreas definida pela Boulevard périphérique de Paris. Um anel viário e uma das mais movimentadas autoestradas da Europa, cujo local corresponde à delimitação feita a Paris intramuros pelo Mur de Thier em 1844 e que foi mais tarde desmantelado entre 1919 e 1929.

Para compreender como se organiza a unidade urbana de Paris e partir à sua descoberta é importante saber que esta se constitui por 20 arrondissements (áreas municipais) distribuídos segundo uma espiral no sentido dos ponteiros do relógio a partir de um ponto central da cidade, no 1º arrondissement, o Louvre. O último digito no código postal corresponde ao arrondissement, isto permite perceber rapidamente a nossa localização e a de um determinado endereço.

O custo de vida em França acaba por não se distanciar muito ao de Portugal. No entanto, Paris é um caso particular, a habitação é extramente cara, assim como a restauração. Contudo, é importante destacar que o salário mínimo Francês ronda atualmente os 1400 euros.

Transportes
A linha de metro é uma das melhores do mundo, consegue levar-nos eficazmente a qualquer parte da cidade, mas convêm andar atento na ligação de linhas e saídas, pois o ritmo de pessoas é frenético. Existe uma variedade de passes combinados semanais e mensais, assim como módulos para curtas estadias. A rede de autocarros funciona, mas na minha opinião mais como complemento, pois o metro serve perfeitamente toda a cidade.

O vélo é uma forma de circular por toda a cidade com bicicletas alugadas, através de um cratão de crédito paga-se uma taxa de um euro, duas horas custam cerca de 7 euros.

Para longas distâncias existe o TGV para conhecer cidades em torno do Paris e restante Europa e o RER para quem vive fora do limite central de Paris.

Este foi o meu caso que acabei por ficar a viver com a minha família em Évry. Esta cidade é uma das cinco Ville Nouvelle, um projecto urbano desenvolvido em 1965 que procurava evitar a existência de “bairros dormitórios”, dotando-os de equipamentos públicos e empregos perto da residência. A distância ao escritório que se situava no 4º arrondissement, ao qual demorava em média 40 minutos a chegar, tinhas as suas desvantagens, mas também compensava por poder disfrutar de uma cidade junto ao Sena, ainda com algumas zonas campestres lindíssimas por explorar.

Alojamento – um caso sério
Encontrar alojamento em Paris é extramente difícil, caro e é algo a ser organizado com tempo. Grande parte das agências pede taxas que corresponde a um mês (ou até dois) do preço do aluguer, um fiador francês, caução e o primeiro mês de aluguer. Portanto, há que vir com o bolso bem preparado.

 Uma boa opção, mas que normalmente não é fácil de conseguir, são as residências de estudantes existentes em Paris. Contudo é necessário fazer uma candidatura e dependerá das vagas existentes.

A Residência André de Gouveia (RAG), mais conhecida pela Casa de Portugal da Cité internationale universitaire de Paris (CiuP) é umas destas opções, mas são extremamente concorridas. As candidaturas a estadias na Residência, são formuladas "on-line" através do site www.ciup.fr e submetidas à Comissão de Admissões da Residência. As mensalidades são a partir dos 470 euros, dependendo da duração da estadia e do estatuto do residente.

Le Centre du Logement des Jeunes Travailleurs, Etudiants et Stagiaires (C.L.J.T), oferece 10 residências, situadas na área central de Paris, com 60 a 160 camas cada. Em geral dispõem de quartos individuais e studios. Os serviços oferecidos variam de residência para residência, assim como os preços que vão dos 500 aos 700 euros.

Français! Français!
A língua para mim, foi uma das maiores dificuldades, mesmo que tenhas algumas bases, recomendo algum estudo ou mesmo um curso de língua. Em Paris grande parte dos cursos funcionam por semestre e não são propriamente baratos. A opção que encontrei foi num centro social em Évry, que por um custo bastante aceitável oferecia aulas de francês a estrangeiros residentes.

Mas claro que a aprendizagem só vai acontecer mesmo com a prática. E esta é uma oportunidade única de praticar a língua num contexto de total imersão.  Pode-se ter a sorte de trabalhar numa empresa que não se importe no início de adaptar-se e misturar o inglês nos diálogos, como foi o meu caso. No entanto, em Paris muitos são as empresas e os profissionais que não estão abertos a isso. Claro que isto varia e depende entre outros fatores da área profissional e dimensão da empresa.

J’aime rien, je suis parisien!
Este slogan não surgiu por mero acaso, os parisienses têm fama de não ser pessoas fáceis e decerto não o são. Mas, convém não generalizar, em geral os franceses com quem tive a oportunidade de conviver mostraram-se simpáticos e acolhedores. Posso dizer que em muitos aspetos somos semelhantes e a nossa cultura toca-se inevitavelmente, nem que seja pela grande comunidade de emigrantes portugueses a residir em França.

Os estereótipos e o novo emigrante
              

Um dos filmes que tive a oportunidade de ver em Paris, La cage dorée, demonstra bem a realidade presente na comunidade de emigrantes em Paris. Os estereótipos sociais sobre o emigrante português ainda existem em torno de uma ideia do servilismo de uma classe de operários e porteiras. No entanto, essa noção foi-se alterando associando-se o português não apenas a uma mão-de-obra fácil, mas a uma pessoa trabalhadora de valor e confiança.

A atual vaga de emigração distancia-se um pouco desta realidade. Anteriormente, já muitos seguiram o caminho de procurar um futuro fora do seu país, mas grande parte iam sem saber bem para onde, em que condições, e se poderiam algum dia voltar. É pois importante ressalvar que são a família, amigos e conhecidos emigrantes que nos dão agora a mão e permitem este “salto” por um futuro de maior aceitação e partilha intercultural.

Quando vivemos fora do nosso País, os amigos que nos acompanham passam de certa forma a ser a nossa família. O grupo de Portugueses a residir em Paris é bastante alargado, basta conhecer um ou outro português para em pouco tempo estar em contacto com uma autêntica comunidade de convívio, partilha e entreajuda. E quando bater a saudade são alguns os restaurantes portugueses, para lembrar um pouco o sabor de um bom bacalhau.

Cultura, cultura e cultura
Na cidade em que a cada olhar descobrimos algo novo, a oferta cultural é infindável, todo o primeiro domingo de cada mês podemos aproveitar os museus de Paris sem pagar. Jovens com idades até aos 25 anos, têm acesso gratuito ou bilhetes com preços reduzidos em grande parte dos espaços culturais. A maioria dos museus e galerias oferece uma noite por semana em que abre até mais tarde, se houver tempo e oportunidade é uma boa forma de passar o serão e evitar as multidões.

Como já referi, o sol não é o melhor amigo de Paris. Por isso recomendo que quando o sol resolver espreitar aproveitem bem o dia ao ar livre nos vários espaços verdes que existem na cidade. Os parisienses adoram os jardins públicos, é muito comum nas sextas-feiras ao final da tarde e nos fins-de-semana vê-los passar na rua com uma baguete ou uma garrafa de vinho para usufruírem do bom tempo num parque ou mesmo junto ao Sena.

Para mim um dos parques mais interessantes, e que fica um pouco fora do circuito turístico comum, é o Parc de Buttes-Chaumont. Inicialmente, uma pedreira abandonada e um depósito de lixo foram transformadas num parque com colinas, rochedos e cascatas. Vale a pena explorar bem este parque que permite diversas atividades de lazer. Outros jardins a não perder acompanhados por uma boa garrafa de vinho são: os jardins do Museu do Louvre (Jardin du Tuileries), os jardins da Torre Eiffel (Parc du Champ de Mars) e o famoso Jardin de Luxembourg (5th Arrondissement).
 
Entre o que é já conhecido do circuito turístico e o que não é assim tão explorado recomendo alguns espaços e momentos que não devem passar ao lado:

“Museu Rodin num dia de sol”. Qualquer parisiense a quem eu perguntasse o que não perder em Paris, a resposta era invariavelmente a mesma. Vale, sem dúvida, desfrutar com tempo dos seus jardins e exposições.

A Catedral de Sacré Coeur é extremamente turístico, mas esta catedral bizantina ao pôr-do-sol e a sua vista sobre a cidade é algo único.

A Catedral de Notre-Dame e a praça Parvis é uma das minhas primeiras memórias de Paris quando a visitei em criança. Vê-la à noite iluminada é um momento a não perder, assim como a restante cidade num passeio junto ao Sena.

Le Marais. A firma onde trabalhava situa-se neste bairro. Frequentado pela nobreza até finais do século XIX, desde então é claramente marcada pela presença judaica. Hoje traduz-se num bairro repleto de artistas, moda e ótimos restaurantes de comida judaica.

Quartier Latin. Um dos meus bairros favoritos com uma ótima ambiência e repleto de deliciosos cafés, onde podemos deambular e descobrir sempre recantos novos.

Museu Jeu de Paume, um pequeno espaço de exposições para amantes de fotografia que passa muitas vezes despercebido.

Passeio junto ao Sena, sempre e em qualquer altura, um dos melhores remédios para alma!

Crepes!!! (Last but not least) Encontram-se em qualquer rua de Paris, simples, com doce, nutella ou o que for. Perfeito num típico dia de frio em Paris.
  
E agora sim O estágio
Um estágio de arquitetura em 3 meses, ou mesmo em outra área, é um tempo curto para assimilar todo aquilo que há para aprender. Por isso recomento que aproveitem ao máximo para aprofundar a vossas capacidades, conhecer novos métodos de trabalho e conseguir contactos. Encontrar uma firma, em que se é convidado à ficar após um estágio, acontece, mas é difícil, principalmente em arquitetura e ainda mais numa firma pequena. As empresas acabam por adotar os estágios de uma forma rotativa, principalmente se forem organizações pequenas.

Trabalhei uma agência de pequena dimensão como procurava, pois acredito ser uma boa forma de aprender e contactar com todas as vertentes relacionadas com o exercício desta profissão. Tive a sorte de encontrar uma equipa dinâmica, disposta a ensinar e partilhar a sua paixão pela profissão, explorando novas ideias e conceitos. A abordagem da empresa passa por uma verdadeira sensibilidade ao detalhe, um conhecimento profundo do processo de construção e processos de sustentabilidade. Em geral, participei em todas as atividades da equipa. Pude trabalhar sobre todos os projetos em desenvolvimento em suas diferentes fases, entre escritórios, edifícios públicos e competições de arquitetura.

Não tirando a seriedade ao trabalho, porque sim estamos aqui para aprender, mas há que saber faze-lo com alegria e partilhando-a com o que estão a volta. Os melhores momentos foram sempre as pausas para o café, preparado pelo sócio de nacionalidade italiana que fazia questão de ter um stock considerável de café de qualidade que ele próprio preparava numa clássica cafeteira italiana. Sobrevivei assim ao caro e imbebível café francês. Por isso se forem verdadeiros amantes de cafeina recomendo que tragam convosco uma boa remessa do bom café português.

Alors, à bientôt!
Foi de todos estes pormenores, momentos e vivências que se construiu esta experiência. Volto com mais certezas quanto ao que quero, e também mais consciente das dificuldades reais que o futuro me pode reservar. No atual contexto de emigração jovem em Portugal, programas de estágios como estes são valiosas janelas de oportunidade. São experiências de vida que nos cultivam, transformam, “abrem o apetite” pela aprendizagem, pelo mundo e pelo que temos para descobrir em nós e nos outros.




                                                                                                                                      Inês Vaz Mateus


1 comentário:

  1. Boa tarde, gostaria de saber como me poderei candidatar para o Programa Leonardo Da Vinci, também em Arquitectura. Gostaria também de ir para França, tenho preferência por Toulouse. Não se existem protocolos pré-feitos ou se terei que contactar eu os Atlier's.

    O meu email é mjtato21@gmail.com

    Gostei muito do seu testemunho Inês, boa sorte.

    ResponderEliminar